Comunidades Remanescentes de Quilombos:

Desenvolvimento,  Sobrevivência , Resistência ou Sub-vivência?

Formadas ao longos dos séculos por fugas de negros  na época escravista, ou por abandono das propriedades pelos  senhores  ou  por migrações  no pós-abolição ,  ou, ainda, por outras razões, as chamadas ´comunidades remanescentes de quilombos´  existem em praticamente todo território brasileiro e  são reconhecidas por apresentarem, geralmente,   características como:

 a) estão localizadas no que se convencionou chamar ´meio rural´ [1]; b) a maioria da população é negra [2]; c) foram formadas há muito tempo; d)  existe um significativo grau de parentesco entre os moradores; e) embora cada família  saiba seus limites, a apropriação da terra é coletiva; f) sobrevivem, geralmente, do extrativismo,  agricultura familiar e/ou pequeno  criatório; g) realizam algumas tarefas em mutirão/puxirum [3]; h) a maioria é cristã [4]; i) falam a mesma língua (portuguesa); j)  se auto-identificam como ´remanescentes de quilombo´

Apesar da ancianidade dessas comunidades, a categoria  sociológica  ´remanescente de quilombo´   foi criada  no processo de discussão  da ultima  Constituição do Brasil, promulgada em 1988. Essa denominação, ainda,  é objeto de muita polêmica, sobretudo, porque muitas pessoas da academia (muitas, aliás, sobrevivem, somente dessas intermináveis discussões e não têm uma relação concreta e/ou  de apoio a seus ´objetos de pesquisas) que acham ´inadequado cientificamente´. Ora como sabemos as ´verdades científicas´ são mutantes ( e não só elas ; tudo muda a todo instante) e só de lembrarmos, por exemplo,  que por séculos a ´Ciência´ tinha como Verdade  que a Terra era o centro do Universo e , depois,   mudou de Verdade ou, que a Raça Negra   ( africanos , negros/as) eram inferiores aos brancos/as por causa da volume do crânio e do comprimento de seus braços .

Embora não tão adequado a este texto, cabe ressaltar que até hoje parte da ´Academia´ não aceita que  utilizemos  os termos Raça, Negra pois  ´provam´ que esses termos não são científicos. No Brasil, como todos/as (incluso a Academia) somos, ainda, colonizados/as , poucos/as se arriscam a ´criar´  teorias ou conceitos a partir de nossa própria ´matriz´.

O fato é que como no Brasil a discriminação da população negra é com base na ´aparência física´ (biótipo) não podemos dizer que há racismo mas não existe Raça, ou que há Brancos/as (e esses se querem e se orgulham disso) , mas não existem Negros/as , porque quem ´inventou´ o termo ´Negro´ foram  os Brancos. Ora,  nesse ´ambiente colonizado´, a rigor, quase todos os termos que  hoje utilizados, foram  ´inventados´ pelos  brancos/as que, então porque apenas  o  termo ´Negro´ ou outros que o Movimento Negro (Movine)  usa , terão que ser rejeitados? Com isso não estou dizendo que o Movine  rejeita a Academia, até porque se rejeitássemos estávamos ´fritos´, uma vez que sem  alguns acadêmicos/as , não estaríamos no nível de luta que estamos,  uma vez que além de contribuições valiosas que algumas pessoas da academia nos deram,  precisamos muitos do ´status´ dos acadêmicos,  para construir nossas ´também mutantes verdades´. A questão é que muitos brancos/as (às vezes racistas inconscientes) , por incrível que pareça , querem, eles próprios,  determinar quais armas, teórica ou práticas,  devemos usar para lutar contra o racismo. Ou seja, o ´inimigo´ quer definir que armas (incluso argumentos) devemos usar contra ele – lógico que seriam aquelas que fizessem com que jamais seriam vencidos! Assim, temos nos dado o direito de escolher as euro/norte-americanas teorias que precisamos para calçar nossa luta. E, muitos de nós está tratando, também de construir nossas próprias teorias – pasmem!!!???

O fato é que no naquele período (Constituinte)  foi ´politicamente conveniente´ ao Movine  cunhar a expressão ´Remanescente de Quilombo´,  para conseguir apoios políticos capazes de garantir a aprovação de alguns poucos dispositivos apresentados para apoiar, de alguma forma,  as comunidades negras rurais via  Constituição Federal. Também cabe ressaltar  que  até hoje existem celeumas (internas)  sobre quem apresentou pela primeira vez   proposta de titulação das terras quilombolas e, inclusive,  usando a expressão ´remanescentes de quilombos´. Embora a proposta final tenha sido encaminhada por políticos do Rio de Janeiro, o  Norte-Nordeste (sobretudo, Cedenpa e CCN-Centro  de Cultura Negra do Maranhão) , sabem que a proposta partiu daqui. Aliás, já tive oportunidade de ouvir ´calada´ (acreditem!!!), um pesquisador do sudeste explanar , com detalhes dedutivos-indutivos-mirabolantes,  sobre a ´origem e razão´ da utilização da ´ remanescentes de quilombos´, na Constituição Federal – como muitos/as de nós do Movine sabe, existem tantos/as  pesquisadores/as (geralmente branco/as, pois eles tem tido oportunidade muitíssimo maiores que nós, de entrar nas Universidades) que ´surfam´, ´que solam´ sobre qualquer tema, inclusive , e principalmente,  sobre as questões ligadas a população negra e indígenas, até porque só podem ser contestados  por eles próprios, pois nossa palavra , nosso falar (negros/as e índios/as) pouco valem no meio acadêmico, só se for para reforçar essa ou aquela tese de alguma  ´pesquisa científica´. Evidente que se alguém do meio acadêmico se debruçar para analisar isso que aqui explicito, vai chegar a algum ´euro-diagnóstico´ , provavelmente,   ligado à ´recalques´, ´mágoas´, etc. Assim, sempre terão argumentos  lógicos ou  logicizados  para nos ´enquadrar´ de tal forma a tentar nos desqualificar.

Bem, voltando à questão-centro deste artigo, pode-se dizer que no caso das comunidades da  Amazônia, o  pouco  avanço tido nas titulações das terras dessas comunidades  somente  se iniciou a partir de pressões diretas e indiretas do movimento negro e dos  ambientalistas, vinculadas a questão da floresta amazônica. Mesmo assim, levou-se algum tempo para que isso ocorresse,  pois o racismo brasileiro impedia que se incluísse  a questão quilombola  até na luta dos ´povos da floresta´.

 
2.
Enfoques  segmentados

2.1   Enfoque ambientalista

O avanço da fronteira  econômica (agrícola, pecuária e mineral)  na região fez com que muitos segmentos populacionais se organizassem mais rapidamente para evitar o aniquilamento –  Chico Mendes não morreu em vão . Movimentos dos seringueiros, dos atingidos por barragens, ribeirinhos  e outros continuam fortes e nesse  bojo entra a questão quilombola.

Ocorre que, como se sabe, conjugar as lutas contra os interesses de multi ou trans nacionais [5] garantindo algum tipo de desenvolvimento local tem sido uma tarefa dificílima, apesar  de certas conquistas diante do que foi (?) a ´febre neoliberal´.

Considerando que os ´grandes projetos´ (minerais, hidrelétricos e outros) sempre geraram nos  entornos os chamados ´bolsões de pobreza´  e acabam deteriorando a qualidade de  vida da população nativa – inclusive porque provoca migrações desordenadas -, havia necessidade de pressões externas para impedir a aceleração da devastação ecológica[6].    

Entretanto, o movimento ambientalista internacional impunha uma certa  radicalização que acabava prejudicando os próprios ´povos da floresta´, inclusive por forçar a criação de grandes reservas biológicas, florestas nacionais  e outras  reservas ecológicas, sem levar em conta que nessas áreas existiam populações nativas que, até então, viviam  em harmonia  com o meio ambiente. Então,  caberia  relativizar essas questões,  agora ligadas ao chamado ´desenvolvimento sustentável ´            

Sobre isso, creio valer  a pena registrar algumas passagens do livro ” A Amazônia  e o Desenvolvimento Sustentável” [7]  onde o autor desenvolve comentários sobre o conceito ´clássico´ de desenvolvimento sustentável – ” desenvolvimento que satisfaz as necessidades da geração presente sem comprometer as possibilidades das futuras gerações em satisfazer suas necessidades” :

Diz o autor que o conceito reconhece a “(…) existência de um ciclo de causação cumulativa entre o subdesenvolvimento, as condições de pobreza e os problemas ambientais. As populações pobres em sua luta pela sobrevivência são impelidas ao sobreuso dos recursos naturais e do meio ambiente em geral, minando as próprias bases para um desenvolvimento sustentável a longo prazo (…) “.

   

2.2 – Enfoque cultural

No Brasil em vista do baixo nível de informação da maioria da população e do eurocentrismo hegemônico, quando se fala ´negros´  uma das idéias que prevalece inicialmente é : Cultura    ritmos, músicas, danças, tambores, correntes , pelourinhos, etc.

Assim, a defesa dos direitos das comunidades remanescentes de quilombos para muitos , deve ser ter como enfoque principal a ´preservação da cultura´. Então, muitos que se interessam pelo assunto, esperam encontrar nessas comunidades, além de negros e negras (´puros´, como muitos dizem e que não existe),   todo um conjunto de expressões culturais diretamente advindos da África ou marcas  físicas fortes ´do tempo da escravidão´.

Todos sabemos que a cultura é dinâmica e que, como já se sabe, a igreja católica colocou  todo seu ´cristianismo´ a serviço dos europeus  invasores e da  validação da  escravização de africanos e descendentes [8] , inviabilizando, por exemplo, na maioria dos quilombos,  a valorização das religiões de matriz africana

 

2.3  – Enfoque de Defesa dos Diretos Humanos-Cidadania

Embora no Brasil a questão dos Direitos Humanos só tenha adquirido ´corpo´  a partir de  direitos políticos, depois que muitas  pessoas da classe média foram assassinadas ou tiveram que se exilar durante a ditadura militar  de 1964 – antes disso já havia matança de negros pela polícia, abuso sexual  e trabalho infantil de  meninas e meninos negros e indígenas, mas isso  e outras forma de violência não se ´enquadravam´ em ´direitos humanos´ (!!!) – , esse enfoque tem servido de ´guarda chuva´ para abrigar não somente as questões dos negros e negras  quilombolas, mas do segmento negro em geral.

             Não se pode dizer que isso se dá sem conflito, pois boa parte dos ativistas de defesa dos Direitos Humanos advogam uma formulação  universalista, a qual, de certo modo, não inclui o tratamento das desigualdades  raciais, justamente no que ela tem de particular.

           

3. Dificuldades da interdisciplinaridade da questão

Aos enfoques antes citados somam-se as questões dos estudos que dão suporte acadêmico à Causa. Nesse sentido,  há divergências entre as questões levantadas pelas diversas matizes e matrizes teóricas adotadas, por exemplo,  por antropólogos, historiadores, economistas e juristas.  

Os juristas exigem conceitos e definições que os antropólogos argumentam só podem partir da própria população quilombola;  alguns historiadores têm dificuldade de reinterpretar dados históricos, colhidos de documentos cartoriais, das igrejas e outros lugares,  elaborados pelos  e com a visão escravista.  Boa parte dos  economistas    dos que já ouviram falar da questão -, não valorizam as expressões da afro-negra-cultura  e a forma de vida  simples das  ´populações tradicionais´ , enfatizando somente a necessidade de pretenso  desenvolvimento  econômico. Evidente que há que se estimular mudanças, mas procurando garantir a transmissão de valores culturais e de formas de produção adequadas ao local.   

4. Como navegar com tantos ´nortes´?  

     O movimento negro sabe que as questões das discriminações/desigualdades raciais, principalmente ,  a questão negra,  não é nada simpática  dentro do país  – não  é  ´sex´, como dizem alguns europeus. Uma das razões para isso é que o racismo beneficia todas as pessoas  brancas: as ricas (materialmente)  porque podem explorar as pessoas  negras como mão-de-obra mais barata, quando lhes apetece, e as pessoas  brancas pobres (materialmente).  porque podem usar como privilégio, o fato de pertencer à mesma raça das pessoas que formam a  classe dominante e, assim, ter prioridades na ocupação de vagas no sistema educacional e/ou  no mercado de trabalho ou de ser melhor atendidas no precário sistema de saúde. Então, praticamente,  não há brancos interessados em eliminar as desigualdades raciais no Brasil, onde a população negra corresponde a cerca de 46%. 

Por outro lado, as mesmas questões ideológicas que fizeram  e fazem com que a maioria do  segmento a negro tenha uma  baixa auto-estima coletiva  ( teoria da  inferioridade racial , mito da democracia racial, necessidade de  branqueamento e outras), estão presentes e, tudo indica, de forma mais aguda, nas populações quilombolas. Sabe-se de muitas associações quilombolas que só aceitam ser apoiadas por ONGs /pessoas  brancas –  dá para lembrar do tempo em que a maioria de mulheres só acreditava na competência de  médicos  e não de médicas? Pois é! O processo é similar.

Sobre isso,  cabe ressaltar que, além das questões ligadas às discriminações/dicotomias  entre meio rural x meio urbano, trabalho manual x intelectual, relações de gênero, existem estudos que sinalizam para o fato que, em certa medida, o grau de submissão afro-negra-masculina no Brasil  está vinculado  implicitamente à  ´doutrina machista´ , onde é  dever do homem,   proteger sua família – esposa/companheira e prole -, porém como o racismo praticamente impede que o homem negro cumpra essa ´função social´,  ele, ao contrário de muitas mulheres negras, e, em vista do  seu próprio machismo,  tenta fazer um enfrentamento mais ´atenuado´, ´transigente´,  com os  homens  e mulheres brancos/as acerca do racismo. Então, tudo tem sido mais difícil nessa luta contra o racismo, quer no meio urbano quer no meio rural e a presença de mulheres negras, historicamente, na luta, tem  tido uma importância singular mesmo nessa ´subvivência´ coletiva da população negra brasileira.  

Outros aspectos que acredito importantes destacar, estão ligadas: a) praticamente todos  quilombolas tiveram ancestrais que passaram pelas senzalas, a exemplo de qualquer pessoas negra no Brasil; assim, a maioria rejeita as religiões de matrizes africanas (embora pratiquem atos que estão ligadas a alguma delas) ; b) muitos quilombolas (alguns estimulados por membros de ONGs brancas) , estão tentando fazer com que a luta quilombola fique desvinculada da luta do movimento negro como um todo – ´dividir para reinar´;   aproveitar a auto-rejeição aprendida coletivamente; aproveitar um  mais ilusório que real empoderamento  conseguido pelos quilombolas, muitos dos quais , entretanto, continuam dependendo de brancos/as para lhes abrirem portas para alcançarem autoridades (quase todas brancas). Assim, evidentemente, tudo fica mais difícil, mas , jamais nos abateremos , pois o lema é travar todas as batalhas , para seguir as trilhas de nossos antepassados , os quais fizeram o máximo para que pudéssemos estar aqui e, no meu caso, neste momento, tentando, através deste pequeno texto, fazer a parte que me cabe e que cabe a nosso Cedenpa.  

    

5. A titulo de síntese

Considerando que na Amazônia existem mais de trezentas comunidades remanescentes de quilombos, sobretudo,  às margens dos afluentes e do próprio  rio Amazonas e que muitas estão ora  aglutinadas  em várias associações ora  isoladas, cada comunidade tem sua particularidade de luta. Na ´Ilha do Marajó´(Pará), por exemplo, onde os/as fazendeiros/as  oprimem, por séculos,  a população quilombola a ponto de, além de usurpar suas terras,  confinam-nas entre cercas de arame farpado, como se fosse gado em suas pastagens, muitas pessoas negras,  ´ainda hoje´,   praticamente,  se ajoelham diante de patrões e autoridades brancas. Isso é gravíssimo, pois mostra, entre outras coisas, o medo  introjetado  pelos  quilombolas daquela região (e não só nela [9]) , por força da crueldade durante o escravismo que se desdobra até nossos dias. 

Assim, apesar de secular, há lugares em que a luta está apenas começando. Há esperanças de que o governos progressistas, o atual, que  com a  criação da Secretaria Especial de Políticas para Promoção da Igualdade Racial – Seppir, possam implementar medidas capazes de apoiar a luta do movimento negro na sua – também secular  – busca de respeito, equidade e maior  liberdade ao povo negro brasileiro do meio urbano e rural.

 

6. Algumas questões de  quilombolas do Pará

No Pará onde estão identificadas mais  de 250 comunidades quilombolas, o trabalho de titulação e apoios ao desenvolvimento  vem sendo realizado – não sem conflitos – principalmente  através do Governo do Estado (Programa Raízes/Seju e ITERPA), Governo Federal (UFPA-Naea, Incra, GRPU), além de Ongs como  Unamaz  Fetagri , CPI-SP,  Fase,   Comissão Estadual Quilombola e Cedenpa.  [10]

Praticamente todas as comunidades desenvolvem atividades a nível de subsistência, tendo pouco excedente  para  escambo ou  comercialização.

Muitas têm sua sobrevivência centrada no extrativismo: mineral (pedras, areia); vegetal (madeira, carvão, castanha, outras essências florestais); e extrativismo animal (pesca e caça). Quase todas desenvolvem  pequena agricultura amparada no plantio de mandioca para fabricação de farinha.  e criatório de pequenos animais (galináceos, suinos, etc.). Algumas comercializam algum tipo de artesanato  para aumentar a renda.

Do ponto de vista de equipamentos sociais, embora não faltem capelas/igrejas e campos de futebol ,   nas comunidades em que existem escolas, o ensino, na maioria,  só chega até no, máximo, à 4ª série do fundamental .

Então, é sintomático que o nível de aspiração social se apresenta muito baixo, que exista um desânimo cronificado em boa parte população, que as perspectivas sejam  desalentadoras,  um ´pensar pequeno´  é predominante e  só na sobrevivência do dia-a-dia, é que interessa. Dentro desse quadro,  muitos exageram no álcool, talvez por não enxergar qualquer possibilidade de mudança para melhor – é fato que isso também ocorre com parte do segmento negro que vive no  meio urbano. Diante de situações como essa,  entende-se que   falar em  ´ desenvolvimento sustentável´  é, ainda, uma certa miragem, pois a situação sócio-econômica é tão precária  (apesar de que muitas atividades culturais às seguram) que  só cabe mesmo é  falarmos  ´sobrevivência´, ´resistência´  – como, aliás, a maioria das famílias negras no Brasil inteiro vive.

A experiência tem mostrado ser  preciso que o movimento negro urbano em geral,  se encha de coragem, seja mais incisivo em sua luta como um todo, brigue menos entre si, e possa transmitir mais segurança e apoio às comunidades quilombolas, para que elas próprias possam aglutinar forças para fazer a interação  dos enfoques citados (ambientalista, afro-cultural , direitos humanos e outros),  e incluir a necessidade da revalorização da ancestralidade africana (que chamamos ´questões da negritude´) , para poder garantir não só a ´sustentabilidade´  mas a junção de sua luta com as dos demais brasileiros, para construir uma sociedade efetivamente justa.

  

7. Algumas Sugestões

a) Estimular o aumento do nível de  organização das comunidades quilombolas, procurando preservar  aspectos que lhes sejam peculiares;

b) Apoiar de maneira decisiva a titulação das terras das comunidades e projetos de desenvolvimento sustentáveis;

c ) Adaptando algumas sugestões do Dr.Paulo Kitamura, acreditamos ser importante: também:

c-1) participação das populações quilombolas no planejamento e implementação de programas e projetos  de cunho sócio-econômico-ambiental-cultural para poder moldar instrumentos  adequados às suas condições específicas;

c-2)  estimular a criação de ´cooperativas quilombolas´ de forma que  potencializar a marca ´quilombola´  dentro da  chamada ´economia popular´ ou ´comércio justo´

d) estimular a adoção – feitas as devidas adequações -, de  método  educacional do tipo casa familiar rural/pedagogia da alternância, ou outra similar mas mais  ´nativa´ , inclusive para estimular o  aumento da auto-estima das comunidades quilombolas;

e) Estimular que, além de farinha, a comunidade agregue mais valores a seus produtos, reduzindo o nível de venda de produtos ´in natura´, os quais, se beneficiados, podem aumentar a renda coletiva ;

f) Estimular a armazenagem de alguns produtos para a espera de preços melhores;

g) Estimular a implantação de projetos que possam gerar rendas mais significativas que as auferidas atualmente  – piscicultura, apicultura, etc.

h) Estimular o resgate, valorização,  produção, comercialização de artesanatos ligados à afro-cultura  à região.

 i) estimular a população quilombola a produzir praticamente tudo o que consome, valorizando assim suas frutas, suas criações (bichos), seus bejús, tapioquinhas, reduzindo assim, sua dependência de produtos externos, muitos dos quais são deletérios à saúde da população, inclusive muitos que são anunciados na TV;

h) Interceder para que as Prefeituras,  Secretaria de Agriculturas,  Emater(s) e Centros da Embrapa,  apoiem tecnicamente as atividades das comunidades quilombolas , procurando respeitar  suas especificidades  e a experiência de seus habitantes nas lides rurais.

 

Para finalizar ouso dizer : “ Negras e negros, do meio rural , urbano ou de fronteiras: Estar consciente  de que a  tal  ´ realidade´ não está posta,  é saber que  se nos juntarmos, abdicando qualquer privilégio ou vaidade  pessoal ,  podemos  sim,  fazer nossos/as ancestrais  orgulharem-se de ter deixado pessoas capazes de conseguir a equidade racial nesta Brasil.”         

 

Nilma Bentes


[1]  Existe uma discussão sobre quilombos urbanos; não é o caso a ser tratado no momento.

[2] Pessoas de ambos os sexos, brasileiras ou não,  com biótipo semelhante a membros  de etnias africanas,  que  foram escravizados, que compartilhem identidade racial , referência histórica  e, ainda,  que se auto-identifiquem como  negras . Lembra-se que Boa parte dos negros/as brasileiros não gostam de ser negros – inclusive quilombolas

[3]  Atividades onde todos ajudam na realização de uma tarefa comunitária ou de uma família.

[4]   praticamente todo o segmento negro foi  ´cristianizado´ (´aceitar´ Cristo) nas senzalas ou beiradas das ´casas grandes´

[5]  Também de empresas  depredadoras nacionais e indivíduos inescrupulosos (madeireiros, grileiros, pecuaristas, e outros_ 

[6]  A história mostra que no Brasil as grandes mudanças só  têm ocorrido por pressão internacional 

[7] , do Dr. Paulo Choji Kitamura – Embrapa-1994.

[8]  A Igreja Católica procurou de alguma forma ´proteger´ o índio, mas ela própria teve escravos negros.

[9]  Soube-se de um caso (não averiguado inteiramente) de que  um  capataz de grileiro, após ´deixar´ um quilombola subir em um açaizeiro (nas terras da comunidade, mas grilada pelo patrão do mesmo) , quando o quilombola estava quase alcançando o cacho de açaí, o tal capataz atirou e matou o quilombola. O Cedenpa está tentando conseguir maiores dados sobre o fato, mas a família da vítima está apavorada e acha que é muito perigoso mexer com o caso.

[10] Seju – Secretaria de Justiça; ITERPA-  Instituto de Terras do Para);  UFPA-Universidade Federal do Pará-NAEA-Núcleo de Altos Estudos Amazônicos;  Unamaz – Universidade da Amazônia; Incra- Instituto Nacional de Reforma Agrária ; Fetagri- Federação dos Trabalhadores na Agricultura  , CPI-SP-Comissão pró-Índio de São Paulo, FASE- Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional,  Coordenação  Estadual Quilombola Malungu (representantes de associações quilombolas) e Cedenpa- Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará

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