A comunidade negra brasileira sofre por diversos problemas sociais e políticos, porém um dos grandes obstáculos para a ascenção dessa comunidade está relacionado a falta de oportunidades para empreender.


Segundo estudo da Associação Nacional dos Coletivos de Empreendedores Negros (ANCEABRA), somente 3,8 por cento dos negros conseguem ser empreendedores no Brasil, embora sua população de origem africana seja superior a marca de 50 por cento da nação. Apesar disso, os números também mostram que o segmento negro é maioria no setor informal, justamente pela falta de oportunidades de emprego formal e da dificuldade de abertura de empresas legalizadas.

Os desafios para a criação de empresas pelo público afro-brasileiro passam pela falta de estímulo ao empreeendedorismo, a ausência de tradição familiar e sobretudo, a dificuldade de acesso ao capital. O Brasil nunca teve uma política pública focada na promoção de empreendimentos gerenciados por negros.

Essa realidade de invisibilidade negra no setor empresarial contrasta com a posição do Brasil no ranking mundial do empreenedorismo, que o coloca na 5ª posição à frente de diversos países da Europa. Em geral, os empreendimentos de sucesso são gerenciados por homens brancos da região sudeste do Brasil. Uma pesquisa do Instituto Ethos mostrou, por exemplo, que as mulheres negras são apenas 0.5 por cento dos executivos das 500 maiores empresas do país.

O Brasil, que orgulhosamente se apresenta com uma nação mulicultural e multirracial, está atrás de nações com semelhantes composições étnicas. Nos Estados Unidos, somente a comunidade afro-americana é reponsável pela geração de 1.9 milhão de negócios. Esse número reflete como o poder de compra dessa comunidade. De acordo com o “The State of the African-American Consumer Report”, um relatório sobre negócios da comunidade negra estadunidense, nos Estados Unidos, no ano 2015, o poder de compra da comunidade afro-americana será de 1.1 trilhão de dólares – o que deve gerar ainda mais negócios para a comunidade negra, apesar da já conhecida crise econômica que aquele país enfrenta.

Na África do Sul, país que passou por décadas de segregação formal, uma legislação vem ajudando a criação de uma classe média negra empreenedora, a Black Economic Empowerment (BEE). Basicamente, essa lei garante que para uma empresa fazer contrato com o governo precisa ter cotas de negros na sua gestão, fazer cursos para formação de executivos negros e somente tercerizar serviços com outras empresas também certificadas no programa. Essa política tem contribuído para a distribuição de renda sul-africana.

No Brasil, o poder de compra da comunidade negra também aumentou significativamente na última década. De acordo com o estudo do Fundo Baobá/Data Popular, os aproximadamente 100 milhões de brasileiros de origem afro movimentam cerca de R$ 673 bilhões por ano. A questão que se coloca para os próximos anos é como essa população pode tornar-se também empreendedora e gerar mais riqueza para o país.

A Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016 são grandes oportunidades para que sejam realizadas políticas públicas para o aumento do potencial empreendedor da comunidade negra brasileira. É preciso atrair investimentos por meio de fundos de capital, criar joint ventures e dar oportunidades para os chamados “investidores-anjo” para que estes potencializem e criem no Brasil um expressivo mercado empreendedor gerenciado por negros(as).

Oportunidades não faltam para empreender, porém milhares de jovens que saem anualmente das universidades precisam de um estímulo para isso. Por exemplo, turismo e entretenimento são áreas nas quais a população negra historicamente tem conhecimento. Todos sabem que os negros são a cara do Brasil no exterior, com sua culinária, música e história. Cosméticos e moda são outros grandes mercados em potencial para a criação de negócios negros. A Feira Preta, realizada há 10 anos em São Paulo, é um exemplo do potencial desse segmento ao criar um evento para que empreendedores divulguem seus trabalhos, recebendo milhares de pessoas anualmente.

Os fatos comprovam. Ou o Brasil aproveita o boom econômico, único na história, para efetivar uma verdadeira política de inclusão social pelo empreendedorismo, ou continuaremos vendo por mais 50 anos os tristes números da desigualdade. A presidente Dilma Rousseff lançou como seu slogan de gestão a frase “País rico é país sem miséria”. Mas, podemos dizer também “País sem miséria é país empreendedor”. Que o Brasil faça sua parte.

Por Paulo Rogério Nunes. Publicado originalmente na Revista Americas Quarterly Magazine.

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