Durante o VI Encontro de Mulheres Negras e Quilombolas, que aconteceu entre os dias 12 e 15 de agosto, na comunidade de Itacoã Miri,município de Acará (PA), o “FAOR em Foco” entrevistou Zélia Amador de Deus,professora de artes da Universidade Federal do Pará (UFPA), doutora em antropologia e coordenadora do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (Cedenpa). Zélia falou de resistênciade política, do corpo negro, de racismo, etc. Uma aula!

Abaixo a entrevista:

Faor em Foco: Professora Zélia, o tema do VI Encontro de Mulheres Negras Quilombolas foi”MeuCorpo, Meu Território Sagrado”. Por que este Tema?

zeliaded.jpg Zélia Amador: Porque na verdade o território é o corpo negro, este corpo marcado pela discriminação, pelo racismo. E o corpo que foi exposto ao trabalho forçado, a castigos. É o corpo que foi violentado. Mas este mesmo corpo é o corpo que reage e que é instrumento de resistência cultural. É o corpo que afirma, que agride,que incomoda o status quo. É o corpo capaz de subverter o ordenamento do modelo padrão. Este corpo também deve ser um território que representa e que tem sempre que ser entendido em três dimensões: a do individuo, da raça e da ancestralidade. Quer dizer,um negro ou uma negra nunca respondem por si só. Eles respondem por sua individualidade, sua raça e suas ancestralidades. Significa dizer que o corpo negro é um corpo histórico. Metaforicamente também, este território sagrado é também o território do quilombo, o território onde eu me enraízo, crio laços, tenho as minhas memórias.

FF : Zélia, eventos como o VI Encontrode Mulheres Negras e Quilombolas são espaços fortíssimos de organização e mobilização. Partindo deste ponto de vista, como você avalia o encontro?

ZA: Todos os encontros tem sido muito importantes. Então se estamos na sexta edição, isso prova que temos um acúmulo neste processo de organização. Cada vez que você reúne, que você encontra, que você ouve o depoimento um do outro, que se troca experiências, você se reforça para continuar administrando as adversidades da vida impostas pelo racismo.

FF: O que o Movimento de Negras e Negros da Amazônia considera como grande conquista nos últimos 8 anos?

ZA: Desde 1995, o Movimento de Negras e Negros brasileiros vem lutando pelas políticas públicas de ações afirmativas para a população negra. No entendimento do movimento, são estas políticas que vão de fato combater o racismo, porque com as políticas de ações afirmativas você caminha na linha de eliminar as desigualdades. Eu acho que, neste caminho,o governo Lula avançou dentro do conservadorismo que a sociedade lhe permitiu. Poderia ter avançado mais, a gente sempre quer mais. São séculos de atraso. E lógico que a gente quer muito mais. A gente precisa de muito mais.

FF: Como você vê a participação das mulheres negras neste processo eleitoral?

ZA: Você não tem processo eleitoral. Os partidos se organizam sem pensar na representação da sociedade. As chapas organizadas pelos partidos não levam em conta a representação dos seguimentos sociais. As chapas representam os interesses políticos destes ou daqueles grupos. A gente precisa “enegrecer” mais o debate político. Este tem sido ainda um “debate branco”.

FF: Obrigado

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