Em 18 de setembro de 2012,

À magnífica Prof. Dra. Marília Brasil Xavier

Reitora da Universidade do Estado do Pará


Magnífica Reitora,

Nós do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará dirigimo-nos a Vossa magnificência para expor ao que se segue, em relação ao lamentável crime de racismo acontecido, recentemente, acontecido nas dependências da Instituição dirigida por vossa magnificência, cometido por uma docente, Dr ª Daniela Cordovil, pertencente ao quadro da Instituição referida.
Em primeiro lugar, lamentamos profundamente que fato como esse – crime de racismo– aconteça em ambiente acadêmico, onde, se supõe, costumam conviver pessoas civilizadas, visto que formadoras de opinião, docentes, pesquisadoras e produtoras de conhecimento.
Entretanto, o fato aconteceu, pois a exceção sempre costuma fugir à regra, motivo que mais agrava as circunstâncias do crime que, de pronto, já foi descaracterizado pelo delegado que relaxou o flagrantena medida em que acolheu a queixa, lavrando um boletim de ocorrência de injúria racial prevista na Lei 9416/ 97.Essa norma, se por um lado, pode ser eficaz no combate à discriminação, pois causa impacto negativo conferido à imagem dos agentes na mídia e inclusive põe em jogo o bom nome da Instituição; por outro lado,essa legislação passou a ser usada pelos profissionais do direito de forma intensa, na prática, para substituir a lei Caó (Lei7716/89) que estabelece pena mais severa do que a injúria, crime considerado de menor potencial ofensivo.

Dito de outra forma: significa afirmarque em muitas situações, as vítimas sofreram racismo direto-previsto na lei Caó, porém a conduta é desclassificada para uma capitulação em injúria racial, possibilitando ao infrator o direito à fiança e responder ao processo em liberdade ou mesmo à suspensão condicional do processo nos termos da lei 9099/95.

No nosso entendimento Magnífica reitora, o crime não foi apenas de injúria simples, ou injúria racial, mas crime de racismo.
Senão vejamos: o senhor Rubens dos Santos, a vítima não foi apenas ofendido individualmente e sim ofendido em sua dignidade de ser humano e mais, ao chamá-lo de macaco a professora Daniela recorre a um símbolo carregado de histórias, por sinal trágicas, ao longo da história da humanidade, como observa em artigo recém publicado, na Revista Fórum, a escritora Ana Maria Gonçalves: “Muitos brancos dizem não achar ofensivo o uso de termos como “macacos/a” para se referir a negros por não pensarem direito ou por não conhecerem o legado histórico da escravidão”. No século XIX, magnífica Reitora, usando a ciência como legitimadora moral da escravidão, as elites brancas do país, os eugenistas elaboraram estudos para provar que os negros não eram tão humanos e sim, humanóides e que numa escala evolutiva se assemelharia muito mais a um macaco do que ao ser humano ideal, no caso, o branco caucasiano.
Conhecendo a história magnífica reitora a conotação do símbolo macaco, no mínimo, abriga duas grandes tragédias da humanidade a escravidão de africanos e descendentes e o genocídio (holocausto) do povo judeu ocorrido no período da Alemanha nazista, pleno século XX, que, entre outras coisas, perseguia a criação da raça pura (raça ariana). Não cremos que uma pessoa privilegiada como a Drª Daniela que teve a oportunidade de estudar passando pelos níveis de graduação e pós- graduação, não tenha tido a oportunidade de refletir sobre a questão, inclusive porque utilizou se utilizou do acervo africano para concluir seu doutorado em antropologia, pois pelo que sabemos a docente pesquisa religiões de matriz africana, ou religião
Afro-Brasileira, maneira divulgada pela imprensa.

Pelo exposto, magnífica Reitora, na defesa da dignidade humana de todos os negros do mundo, requeremos, por meio deste, que o crime seja analisado, conforme a natureza de crime de racismo e não como simples crime de injúria racial, pois o ferido em sua dignidade humana, não foi apenas o Sr. Rubens Silva, mas a “raça”(sob rasura) negra, tão vilipendiada pelos horrores do racismo e da discriminação racial, sobretudo porque, no Brasil, se vive hoje na constante busca de cumprimento aos direitos humanos de todos, revendo os erros cometidos no passado. Nesse sentido, para o bem de gerações futuras, exigimos que a docente seja exonerada do quadro da Instituição, fundamentados na Lei 12.288/010, artigo 54: “O
Estado adotará medidas para coibir atos de discriminação e
preconceito praticados por servidores públicos em detrimento da
população negra, observado, no que couber, o disposto na Lei
no7.716, de 5 de janeiro de 1989”.

Atenciosamente.
Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará – CEDENPA.

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